Perguntas e respostas: Suicídio
Eu sou Rafael Thomaz, sou terapeuta cognitivo-comportamental, professor e coordenador do curso de especialização em TCC: prática clínica baseada em evidências. Tenho doutorado em saúde mental pelo IPUB / UFRJ e sou supervisor de casos clínicos.

Vamos falar um pouco aqui sobre a prática clínica: utilizando a TCC para ajudar pacientes que apresentam ideações suicidas. Este é um tema extremamente amplo e muito complexo.
Não vamos ter como abordar aqui:
1) o suicídio concretizado - a morte causada de forma intencional por um comportamento danoso autoinfrigido - e suas consequências psicológicas às pessoas que eram próximas ao sujeito que se suicidou; e
2) o parassuicidio - comportamentos de alto risco, que podem levar à morte, sem que haja clara intenção de se matar.
Vamos às perguntas mais frequentes. Espero poder lhes ajudar!
É possível que um paciente tente suicídio de forma repentina, sem ter expressado pensamentos de morte?
Sim. É possível, mas é menos frequente. Claro que precisamos entender melhor quem é o sujeito, quais são suas características, qual é seu histórico, em que contexto ele estava quando aconteceu...
Além disso, Há diversas outras perguntas que precisam ser respondidas: Estava recebendo tratamentos? Há quanto tempo, quantas sessões? como se deu a construção e a manutenção do vínculo terapêutico?
Precisamos também cogitar a possibilidade de que ele tenha tido pensamentos desesperançosos, com conteúdo de morte, e o terapeuta não tenha conseguido acessar por algum motivo. É preciso ficar atento a possíveis comportamentos incomuns do sujeito, exemplo: carta de despedida ou contato com pessoas com quem não falava há algum tempo, desfazer-se de bens, mudança repentina de humor, anunciar uma viagem de forma inesperada, entre outros.
Além da entrevista clínica, podemos aplicar o BHS, a escala de desesperança de Beck, elaborada por Aaron Beck. Este instrumento nos ajuda a detectar conteúdos de pensamentos desesperançosos do nosso cliente e nos faz ligar maior estado de alerta caso haja alta pontuação. Havendo um histórico de ideações ou tentativas de suicídio, diagnóstico de transtorno crônico, depressão maior no passado, ou mesmo alguma doença física grave, degenerativa ou irreversível, Beck destaca que, mesmo com pontuação baixa no BHS, não podemos nos descuidar deste tema durante o tratamento.
Bem... Como disse, precisamos entender mais e melhor o que, como e por que aconteceu. Respondendo à pergunta, há sim casos nos quais o paciente tenta cometer suicídio, de forma inesperada, e não há, ou pelo menos não era detectável ao longo das sessões, pensamentos desesperançosos. Nestes casos, os pacientes costumam preencher critérios diagnósticos para transtornos psiquiátricos que têm como uma de suas características a falta de controle dos impulsos: transtorno bipolar, transtorno borderline, dependência de drogas,... Sao casos nos quais há variações intensas, abruptas e desproporcionais do humor.
Ainda sou um estudante de psicologia, mas quero no futuro trabalhar na clínica. O que faço se um paciente disser para mim no consultório que quer se suicidar?
É importante colocar esta situação hipotética, que é sem dúvidas uma das maiores adversidades que podemos passar na clínica, em um contexto mais claro, com mais informações. Volto a frisar que é muito importante se sentir seguro com os conhecimentos e competências clínicas adquiridas, para ajudar pessoas que apresentam problemas de saúde mental. Vamos considerar então que você foi bem treinado, está capacitado ou sendo supervisionado, para oferecer o tratamento. Veja... Nós passamos por diversas etapas no processo terapêutico: avaliação detalhada, construção do vínculo terapêutico, conceitualização do caso, favorecimento de um autoconhecimento, montagem de um plano de tratamento, até chegarmos nas escolhas e aplicações das estratégias e intervenções que consideramos as mais adequadas para aquele sujeito, com aquela queixa, naquele momento e contexto. Independentemente do momento que estejamos passando no processo terapêutico, precisamos acionar uma rede de apoio e medidas protetivas de forma urgente.
Exemplo: fazer contato com outros profissionais que o dão suporte e família; estabelecer maior vigilância e ficar atento a qualquer comportamento que indique despedida; impedir o acesso do mesmo a qualquer arma de fogo, objetos cortantes, caixas de remedio, varandas sem rede de proteção; e, havendo alto risco, se entendermos que a família não pode dar suporte naquele momento por qualquer motivo, em último caso, solicitar internação psiquiátrica. Bem... Digamos que na primeira sessão um paciente revele o pensamento de morte.
Neste caso específico pode ser que seja necessário antecipar e aplicar alguma intervenção já na primeira sessão. Favorecer entrar em contato com, entender, aceitar, expressar e validar a emoção; identificar os pensamentos que estão gerando os sentimentos desagradáveis - vazio, angústia, tristeza - e tentar questionar os mesmos para reestruturar possíveis pensamentos distorcidos; tentar entender em que contexto o sujeito está para estimular a avaliação de prós e contras em viver x morrer - tentando ajudar o paciente a visualizar prós em viver.
Alguns clientes, nunca tentaram de fato suicídio, mas podem dizer que querem se matar para conseguirem ganhar atenção de pessoas próximas.
O que fazer nestes casos?